Era uma vez uma bela menina que vivia perto de uma floresta. Morava num pequeno chalé de madeira, ajardinado.
Ela gostava de olhar as plantas e árvores da mata e queria cuidar
delas para que, um dia, a floresta se transformasse num jardim e fosse
perfeitamente organizada e feliz, como ela sempre sonhara.
A
mata possuía uma mangueira alta, uma goiabeira frondosa e um jambeiro
bem encorpado. A menina retirava os gafanhotos da mangueira, arrancava a
trepadeira que insistia em subir na goiabeira e retirava todas as ervas
daninhas,
que brotavam no chão, perto do jambeiro. Todos os dias ela se sentia na
obrigação de fazer esse trabalho, pois não sossegaria enquanto a mata
não estivesse perfeitamente organizada. Queria fazer o bem para a
floresta, mas, no fundo, queria a perfeição em sua obra.
Quando a menina chegara até aquela região, o antigo dono
das terras, um mago muito sério e respeitado, dissera-lhe que deveria
"ser boa para ser feliz". Logo em seguida o mago se foi, desaparecendo
em meio à névoa da madrugada. E ela entendeu que ser boa era cuidar de
tudo e não deixar nada faltar.
Curiosamente,
a menina tinha ouvidos mágicos, que escutavam a linguagem das plantas.
Ouvia reclamações da mangueira que gritava: “Ai! Há muitos gafanhotos em
minhas folhas!”. E lá ia a menina para eliminá-los. Ouvia a goiabeira
dizendo: “Ora, mas que abuso! Essa trepadeira não se cansa de subir em
mim. Desse jeito, vai impedir que o sol me banhe e vou acabar
morrendo!”. E lá ia a menina para dar um jeito nisso também. Quando já
ia descansar um pouco, escutava o jambeiro gritando: “Socorro! Olha
quantas ervas daninhas estão nascendo aqui ao meu lado! Elas vão roubar
os nutrientes da minha terra e ai de mim!”. Imediatamente, a menina saía
para capinar o terreno e resolver mais esse problema.
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Sempre
havia uma sensação de frustração, pois parecia uma tarefa interminável,
um cansaço grande tomava conta dela. Sobretudo quando as árvores
brigavam entre si. A mangueira se irritava com as flores que o jambeiro
jogava no chão. O jambeiro não aceitava a aparência dos galhos tortos da
goiabeira, que, por sua vez, reclamava porque a mangueira tinha
raízes espaçosas demais. Os desentendimentos eram tão frequentes que a
menina já não os conseguia controlar, e assistia às árvores arrancando
as folhas umas das outras.
Um dia a menina percebeu que precisava de ajuda.
Havia
uma tribo de índios ali perto com cinco sábios anciãos. Eram pajés, que
acompanhavam a menina de longe, mas a amavam muito e queriam seu bem.
Quando a menina chegou até a aldeia para lhes contar sobre
os problemas que vivia, os cinco pajés já estavam aguardando a sua
chegada. A menina olhou para eles espantada, pois em seus olhos eles
mostravam grande brilho, e ela sentia que eles tinham respostas
importantes para ela.
Sentou-se então à frente dos índios. O mais velho de todos começou a falar:
—
Menina, nós observamos sua vida e já sabemos o que lhe acontece. Vimos,
na fumaça da fogueira sagrada, tudo o que vem passando e queremos
encontrar, junto com você, novos caminhos.
—
Que bom! Mas antes me deixe explicar que preciso cuidar da mata, das
árvores. É meu dever fazer tudo ficar perfeito — disse a menina. — Quero
também dizer-lhes da minha dor, pois as árvores não me deixam em paz.
Não posso descansar, pois elas sempre me chamam… E me maltratam também.
—
Nós já sabemos o que você vem fazendo. Como dissemos, já vimos seu
passado e seu presente na fumaça da fogueira sagrada. Sabemos da sua
dor, e ela é grande; e queremos mostrar-lhe caminhos para o futuro. Isso
é o que nos importa.
A menina então silenciou. Era necessário silenciar e abrir-se para receber as respostas.
Os cinco índios sábios então lhe apresentaram, cada um a seu turno, um caminho:
— Primeiro caminho: Buscar a liberdade para si.
A liberdade é um bem precioso. Você pode aprender com a natureza. O rio
não se prende a regras. Se as chuvas forem muito fortes, ele
transborda, sai do leito, muda o curso, alaga as regiões ribeirinhas. Se
a estação for seca, ele diminui a vazão, desaparece quase, virando um
riacho. Ele muda mostrando que é livre e flexível. Busque para si essa
mesma leveza, essa liberdade, de às vezes ser diferente do que esperam
de você; liberdade de mudar e de surpreender os outros. O rio nem sempre
é bonzinho, e por isso mesmo ele é tão forte e respeitado.
— Segundo caminho: Buscar a liberdade para o outro.
Ainda aprendendo com a natureza, saiba que tudo acontece no seu ritmo e
no seu tempo. Um homem cheio de boas intenções resolveu ajudar uma
linda planta a florescer mais rápido. Achava que se ficasse ao seu lado
ela iria se nutrir com amor. Ele se aproximava, sentava-se ao lado da
planta e conversava com ela. Às vezes, até cantava para ela. Passava
horas e horas do dia ali,
querendo ajudar sua planta a produzir as mais belas flores. Mas, ao
contrário, as folhas foram se tornando mirradas e murchas, e nenhuma
flor despontava. Foi aí então que ele percebeu que, por ficar tanto
tempo ao lado da planta, estava impedindo que o sol a banhasse. Sim, ele
estava jogando sombra sobre ela. Foi fundamental descobrir que era
preciso deixá-la mais tempo sozinha. E só assim ela conseguiu florescer.
Portanto, liberte as árvores. Abdicar do poder sobre o outro é saber
desapegar-se e permitir que ele encontre luz sozinho também. Quando
libertamos o outro, deixamos que também aprenda com seus próprios erros; permitimos que seu fluxo de crescimento aconteça.
— Terceiro caminho: Buscar o perdão para si.
Perdoar a si mesma é ser auto-indulgente, abrindo espaço para uma vida
mais feliz, dizendo com convicção: “Estou crescendo, quero aprender e
mudar, mas não me obrigo a atingir a perfeição”. Os erros do passado
ficaram lá atrás, numa curva do tempo. A natureza nos ensina que não
vale a pena uma árvore chorar eternamente o fruto que deixou cair antes
do tempo. Se assim ela fizer, não poderá olhar a beleza daqueles outros
que já estão amadurecendo.
— Quarto caminho: Buscar o perdão para o outro.
Perdoar não é esquecer. Mas é recordar de outra maneira. Às vezes,
erigimos altares à mágoa e ao rancor. Permitir que se vá qualquer
desventura é bênção preciosa, é atitude inteligente. O mal só nos
alcança quando assim permitimos. Não é o outro que nos fere, somos nós
que nos ferimos com algo que o outro fez. As mãos dos índios devem estar
sadias, não podem ter ferimentos, quando vão extrair a seiva do
pau-roxo, pois ela é venenosa. Mas se a seiva entrar no corpo de algum
índio e ele adoecer por conta disso, não poderá responsabilizar a
planta. O problema era a sua mão que estava ferida, aberta. Aquilo que
alguém fez, deixemos no passado, que é o seu lugar, sabendo que só nos
atingiu porque, de alguma forma, abrimos espaço para tanto.
— Quinto caminho: Esse quinto caminho não é algo para ser compreendido através de palavras. É algo para ser percebido com a alma.
E,
dizendo isso, o velho pajé retirou um grande cristal mágico de uma
cesta. E com a bela e reluzente pedra nas mãos, prosseguiu:
—
Observe essa pedra. Ela não é o céu, mas reflete o céu. Ela não é a
terra, mas reflete a terra. Não é o fogo, mas reflete o fogo. Guarde nas
suas mãos o poder de ser o que você quiser, refletindo aquilo de que
você se aproxima. Observando esse cristal, peça ao Alto que lhe derrame
luz e paz para seguir em frente, construindo seu futuro. Você é a única
pessoa que tem esse poder! Leve esse presente: o cristal do
auto-encontro.
A menina, emocionada, ficou ali olhando o cristal
enquanto os cinco índios se afastavam. E, através da pedra, ela pôde
ver muita coisa. Era como se a sua percepção tivesse aumentado. Ela viu,
por exemplo, que, de tanto dar atenção às arvores da mata, o jardim do
seu próprio chalé estava abandonado. A pequena rosa, o lírio e o
crisântemo estavam murchos e amarelados, tristes… Ela também viu em uma
das faces espelhadas do cristal, que ela mesma merecia cuidados. Lembrou
que sua vida era também um jardim precioso e que era o momento de dar a
si uma boa dose de atenção. Ali, em meio a tantas descobertas,
desligou-se das coisas por algum tempo. Olhando para o cristal mágico
parou de escutar os gritos das árvores e sentiu-se pronta a percorrer os
seus próprios cinco caminhos.
Depois
de alguns dias afastada, retornou. Estava até curiosa em saber o que
havia acontecido com a mata e as árvores em sua ausência.
Chegando
de volta, notou que a mangueira tinha encontrado sua própria forma de
espantar os gafanhotos, derramando seiva por sobre partes de seu caule.
Havia feito tentativas e encontrou uma saída por si mesma. Não estava
tão bonita como antes, mas havia se fortalecido e na próxima primavera
não teria mais problemas com as pragas. Certamente voltaria a ser
frondosa e bela como antes. A goiabeira, por sua vez, acabou permitindo
que a trepadeira se instalasse em seu tronco, e viu que era possível ter
essa inquilina em seu corpo. Não teria a mesma quantidade
de sol sobre suas folhas, não brilharia sozinha, mas poderia permitir
mais frutos à mata, pois a trepadeira era, na verdade, um pé de
maracujá. De outro lado, o jambeiro viu que as ervas daninhas cresceram,
mas não o ameaçavam de verdade. Havia terra para todos. As borboletas
gostaram das ervas que nasceram, pois tinham flores. Os pássaros
agradeciam a presença do capim que eles usavam para fazer seus ninhos e
cujas sementes lhe davam refeição saborosa.
A mata não estava perfeita como a menina queria, não podia ser chamada de um jardim,
mas quem é que pode dizer como é que deve ser a perfeição? A menina viu
que a natureza deu um jeito de resolver as coisas e que ela podia agora
olhar para dentro de si.
Refletiu
sobre as palavras do mago: “Você precisa ser boa para ser feliz”, e
agora as interpretou de um outro modo. Era fundamental que ela fosse
boa, antes de qualquer coisa, para si mesma, a fim de alcançar a
felicidade.
Voltando
ao seu chalé, colocou o cristal mágico sobre uma mesa e decidiu que
viveria buscando caminhos novos. Decidiu que, a partir daquele dia, tudo
ia mudar. O cristal mágico do auto-encontro iria nortear seus passos,
pois dentro de si estavam todas as respostas. Olharia mais seu próprio
jardim, cuidaria de suas próprias coisas.
A
partir daquele dia, teve um universo maior de alternativas e, quando
alguma árvore começava a chamá-la, tinha total liberdade de escolher se
queria ou não interferir. Em virtude disso, as árvores aprenderam a
crescer sozinhas. A menina, depois de alguns anos, foi chamada à aldeia.
Os cinco pajés queriam saber como ela estava. Percebendo como havia se
tornado sábia, permitiram que fosse, mesmo jovem, a sexta "anciã" da
tribo que, com sua experiência, começaria a ajudar outras pessoas, sem
jamais esquecer de si mesma.
Por Kau Mascarenhas
"JUNTE-SE ANÓS NESTE IDEAL: DIVULGUE O ESPIRITISMO."
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